Atualmente, todos os que prezam as cidades estão incomodados com os automóveis. As artérias viárias, junto com estacionamentos, postos de gasolina e drive-ins, são instrumentos de destruição urbana poderosos e persistentes. Para lhes dar lugar, ruas são destruídas e transformadas em espaços imprecisos, sem sentido e vazios para qualquer pessoa a pé.
Esse é o capítulo 18
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Os centros urbanos e outros bairros que são maravilhas de complexidade compacta e sólido apoio mútuo acabam displicentemente desentranhados. Os pontos de referência são aniquilados ou tão deslocados de seu contexto na vida urbana que se tornam trivialidades irrelevantes. A feição urbana é desfigurada a ponto de todos os lugares se parecerem com qualquer outro, resultando em Lugar Algum. E, nas áreas menos bem-sucedidas, os usos que sozinhos perdem função – shopping centers, ou residências, ou locais de reunião pública, ou conjuntos comerciais – são separados um do outro.
E nós culpamos os automóveis por tudo isso.
Imaginemos que os automóveis nunca tivessem sido inventados ou tivessem sido deixados de lado e que utilizássemos no lugar deles um transporte de massa eficiente, cômodo, veloz, confortável e motorizado. Sem dúvida economizaríamos um dinheiro enorme, que poderia ter um fim melhor. Mas não foi assim.
Suponhamos que também tivéssemos reurbanizado, expandido e reorganizado as cidades à imagem do plano e de outros ideais antiurbanos do planejamento convencional.
Teríamos os mesmos resultados que atribuí aos automóveis alguns parágrafos acima. Esses resultados podem ser repetidos palavra por palavra: as ruas são destruídas e transformadas em espaços imprecisos, sem sentido e vazios para qualquer pessoa a pé. Os centros urbanos e outros bairros que são maravilhas de complexidade compacta e sólido apoio mútuo acabam displicentemente desentranhados. Os pontos de referência são aniquilados ou tão deslocados de seu contexto na vida urbana, que se tornam trivialidades irrelevantes. A feição urbana é desfigurada a ponto de todos os lugares se parecerem com qualquer outro, resultando em Lugar Algum. E, nas áreas menos bem-sucedidas… etc.
E então o automóvel teria de ser inventado ou tirado do esquecimento. Porque, para as pessoas morarem ou trabalharem em cidades tão inadequadas, os automóveis seriam necessários para poupá-las do vazio, do perigo e da extrema padronização.
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questionável que parcela da destruição provocada pelos automóveis nas cidades deve-se realmente às necessidades de transporte e trânsito e que parcela deve-se ao puro descaso com outras necessidades, funções e usos urbanos. Como os planejadores urbanos que não conseguem pensar em outra coisa que não projetos de renovação, porque desconhecem quaisquer outros princípios respeitáveis de organização urbana, da mesma maneira os construtores de vias públicas, os engenheiros de tráfego e, mais uma vez, os urbanistas não conseguem pensar no que realmente podem fazer, dia a dia, a não ser solucionar congestionamentos quando acontecem e aplicar a previsão que tiverem à mão sobre como movimentar e estocar mais carros no futuro. É impossível que pessoas responsáveis e práticas descartem táticas inadequadas – mesmo quando o resultado de seu trabalho lhes cause desconfiança – se a alternativa for, em vez disso, ficarem desnorteadas sobre o que e por que fazer.
Comunicação e transporte bons não são apenas difíceis de obter; são também necessidades básicas. A questão fundamental nas cidades é a multiplicidade de escolhas. É impossível aproveitar-se dessa multiplicidade sem ter condições de se movimentar com facilidade. E a multiplicidade de escolhas nem existiria se não pudesse ser estimulada por usos combinados. Além disso, o alicerce econômico das cidades é o comércio. Até mesmo a atividade fabril existe nas cidades principalmente pelas vantagens relacionadas com o comércio, não por ser mais fácil fabricar coisas nas cidades. A troca de ideias, serviços, habilidades e mão de obra, e certamente de produtos, exige transporte e comunicação eficientes, fluentes.
Mas a multiplicidade de escolhas e o intenso comércio urbano dependem também de uma grande concentração de pessoas, de uma combinação intrincada de usos e de um entrelaçamento complexo de caminhos.
Como se pode prover o transporte urbano sem destruir o correlato uso do solo, complexo e concentrado? – eis a questão. Ou, vendo por outro lado, como prover um uso do solo complexo e concentrado sem destruir o transporte correlato?
Existe atualmente um mito de que as ruas, tão claramente impróprias para o fluxo intenso de automóveis, são resquícios antiquados do tempo das charretes e dos cavalos, boas para o tráfego daquela época, mas…
Não pode haver inverdade maior. Sem dúvida, as ruas das cidades dos séculos XVIII e XIX eram adequadas, como ruas, às atividades das pessoas a pé e à sustentação mútua dos usos diferenciados que as circundavam. Mas eram muito inadequadas, como ruas, para o trânsito de cavalos, e isso, por sua vez, as tornava inadequadas em vários aspectos para o trânsito de pedestres.
Victor Gruen, que elaborou um plano de centro urbano sem automóveis para Fort Worth, Texas, do qual darei mais detalhes adiante neste capítulo, fez uma série de fotos para explicar seu projeto. Depois de ver uma rua com um congestionamento de automóveis muito familiar, ele se surpreendeu: era quase tão grave quanto o congestionamento de cavalos e veículos estampado numa foto antiga de Fort Worth.
A vida nas ruas das cidades muito grandes e movimentadas na época das charretes foi descrita por um arquiteto inglês, H. B. Creswell, que escreveu, para a Architectural Review britânica de dezembro de 1958, um relato da Londres de 1890, quando ele era jovem:
A Avenida Strand daquela época (…) era o núcleo do que havia de melhor em Londres. Rodeada por um emaranhado de travessas e becos, a Strand era ladeada por inúmeros pequenos restaurantes, em cujas janelas se alardeavam pratos refinados; tabernas, estabelecimentos de porão, bares de vinho e ostras, vendas de carne e presunto; e pequenas lojas comerciando uma profusão de coisas curiosas e prosaicas, todas enfileiradas, lado a lado, preenchendo o espaço entre os vários teatros (…). Mas o barro!1 E o barulho! E o cheiro! Todos esses defeitos eram um indício de cavalos (…).
O congestionado trânsito sobre rodas de Londres – que em trechos da City era tal que impedia a circulação – dependia inteiramente dos cavalos: carroções, carroças, ônibus, cabriolés e fiacres, coches e carruagens e veículos particulares de todos os tipos dependiam dos cavalos. Meredith refere-se ao “prenúncio da fedentina dos pontos de táxi” de Londres ao chegar de trem: mas o odor característico – pois o nariz reconhecia Londres com excitação jovial – vinha dos estábulos, que eram em geral de três ou quatro pavimentos com rampas em ziguezague à frente deles; [suas] estrumeiras deixavam cheios de moscas mortas os candelabros com filigranas de ferro fundido – a glória das salas de estar das casas de classe média alta e baixa por toda Londres –, e no fim do verão cobertos por nuvens de moscas esvoaçantes.
Um indício mais marcante dos cavalos era o barro, o qual, a despeito da atividade de numerosos grupos de garotos com jaleco vermelho que se lançavam por entre rodas e patas com pás e vassouras enchendo latas de ferro no meio-fio, espalhava-se pelas ruas como uma pasta de “sopa de ervilhas”, que às vezes se juntava em poças encobrindo os meios-fios, e outras vezes recobria o leito da rua como que com uma graxa para eixos ou poeira de farelo, para tormento dos pedestres. No primeiro caso, os rápidos cabriolés ou fiacres espadanavam essa sopa – quando não era interceptada por calças ou saias – por sobre a calçada, de modo que as frontarias da Strand, por toda a sua extensão, tinham uma faixa de 45 centímetros de barro imposta à força. A “sopa de ervilhas” era enfrentada por “carrocinhas de barro”, cada uma com dois rapazes com conchas longas, vestidos como se fossem para o mar da Islândia, com botas até as coxas, roupas impermeáveis abotoadas até o queixo e chapéu de aba larga cobrindo a nuca. Borrifo à vista! O pedestre agora leva o barro no olho! A “graxa para eixos” era combatida com escovas mecânicas puxadas por cavalos, e os viajantes testemunhavam de madrugada a lavagem dos detritos com mangueiras (…).
E, fora o barro, o barulho, que, outra vez provocado pelos cavalos, surgia como uma pulsação descomunal nos distritos centrais de Londres. Era uma coisa inimaginável. As ruas comuns de Londres eram pavimentadas uniformemente com peças de “granito” (…) e o martelar de uma profusão de cascos ferrados sobre elas, o ensurdecedor tamborilar simultâneo das rodas com pneus ressoando do vértice de uma pedra ao da outra, como varetas arrastadas por uma cerca; o ranger e o gemer e o chilrear e o chocalhar dos veículos, leves e pesados, sendo maltratados; o sacudir dos arreios e o tinir e o tilintar de tudo o que seja concebível, ampliados pelos gritos e pelos urros daquelas criaturas de Deus que desejavam dar uma informação ou fazer um pedido verbalmente – provocavam um alarido que (…) está além da imaginação. Não era uma coisa insignificante como ruídos. Era uma imensidão de sons (…).
Essa era a Londres de Ebenezer Howard, e não surpreende que ele achasse as ruas inadequadas para os seres humanos.
Le Corbusier, quando projetou sua Ville Radieuse na década de 1920, como uma versão com parques, arranha-céus e vias expressas para automóveis da Cidade-Jardim de Howard, gabava-se de estar fazendo projetos para uma nova era e, ao mesmo tempo, para um novo sistema viário. Não estava. Com relação à nova era, ele estava apenas adaptando de maneira superficial reformas que haviam sido uma reação a aspirações nostálgicas de uma vida mais simples, ultrapassada, e também uma reação à cidade dos cavalos (e das epidemias) do século XIX. Com relação ao novo sistema viário, ele foi igualmente superficial. Bordou (acho que esta palavra faz jus ao enfoque dele) as vias expressas e o tráfego em seu projeto da Ville Radieuse numa quantidade que aparentemente satisfazia sua noção de projeto, mas não tinha relação alguma com a quantidade imensamente maior de automóveis, vias e extensão de estacionamentos e manutenção que seriam necessários em seus amontoados de pessoas, verticais e repetitivos, separados por vazios. Sua visão de arranha-céus num parque transforma-se na vida real em arranha-céus de estacionamentos. E não há estacionamento que baste.
A atual relação entre cidades e automóveis corresponde, em síntese, a uma das peças que às vezes a história prega no progresso. O período de evolução do automóvel como transporte cotidiano correspondeu precisamente ao período durante o qual o ideal da anticidade, nos moldes de um subúrbio, foi elaborado arquitetônica, sociológica, legislativa e financeiramente.
Mas os automóveis, em si, não destroem cidades. Se parássemos de contar a nós mesmos fábulas a respeito da adequação e do fascínio das ruas do século XIX para o trânsito de charretes e cavalos, veríamos que o motor a explosão, quando entrou em cena, poderia ser um excelente instrumento para incentivar a intensidade urbana e, ao mesmo tempo, livrar as cidades de um de seus sérios atrasos.
Não só os motores dos automóveis são mais silenciosos e limpos do que os cavalos, como também, o que é mais importante, um número menor de motores faz o mesmo trabalho que um número maior de cavalos. A potência dos veículos motorizados e sua velocidade maior que a dos cavalos podem facilitar a conciliação de grandes concentrações de pessoas com um trânsito adequado de pessoas e mercadorias. Na virada do século, as ferrovias já haviam demonstrado há muito tempo que as locomotivas eram um ótimo instrumento de conciliação de concentração com trânsito. Nos lugares a que as ferrovias não podiam chegar e nos serviços que elas não poderiam fazer, os automóveis, entre ele os caminhões, ofereceram outros meios de reduzir o imemorável congestionamento de veículos nas cidades.
Erramos ao substituir, na prática, cada cavalo das ruas lotadas das cidades por cerca de uma dúzia de veículos motorizados, em vez de usar cada veículo motorizado para substituir cerca de meia dúzia de cavalos. Os veículos motorizados, por serem superabundantes, trabalham devagar e são muitos inativos. Como uma das consequências de tão baixa eficiência, os veículos possantes e velozes, afogados na própria redundância, não andam muito mais rápido que os cavalos.
Os caminhões, de modo geral, realizam muito do que se poderia esperar dos veículos motorizados nas cidades. Fazem o trabalho de um número muito maior de veículos a tração animal ou de homens sobrecarregados. Mas, justamente porque os veículos de passageiros não o fazem, o congestionamento, por sua vez, reduz enormemente a eficiência dos caminhões.
Hoje, aquele que se desespera com a guerra entre esses aliados potenciais, automóveis e cidades, tende a descrever o impasse como uma guerra entre automóveis e pedestres.
Está na moda supor que a solução se encontra na destinação de certos lugares para pedestres e outros lugares para veículos. Talvez acabemos fazendo essa separação, se decidirmos que é realmente isso o que queremos. Mas essas soluções só são factíveis, em qualquer caso, se se contar com o pressuposto de uma queda estrondosa no número de veículos que utilizam as cidades. Do contrário, os estacionamentos, as garagens e as vias de acesso necessárias à volta do espaço dos pedestres atingirão um número tão grande e contraproducente, que seriam medidas de desintegração urbana, e não de recuperação urbana.
O mais famoso plano para pedestres é o de Gruen, feito para o centro de Fort Worth. A empresa Victor Gruen Associates, de arquitetos e urbanistas, propôs que uma área de quase 2,5 quilômetros quadrados fosse circundada por uma via perimetral com acessos para seis enormes garagens longas, com capacidade para 10 mil carros cada uma, as quais se estenderiam da perimetral até bem dentro da área central. O restante da área ficaria livre de automóveis e passaria por uma grande reforma, nos moldes de um centro urbano de usos combinados. O plano teve obstáculos políticos em Fort Worth, mas outros bem parecidos foram propostos em mais de noventa cidades e experimentados em poucas delas. Infelizmente, os imitadores ignoraram o fato fundamental de que o plano abordava toda a área de Fort Worth que poderia ser chamada de urbana como um conjunto interligado, ininterrupto, o que fazia sentido; nesses moldes, era um instrumento de concentração, e não de separação; nesses moldes, o plano promovia uma complexidade maior em vez de uma simplicidade maior. Nas imitações, quase invariavelmente se distorce a ideia com projetos graciosos e tímidos para isolamento de umas poucas ruas de compras, à moda dos shopping centers suburbanos, circundando-as com áreas mortas na forma de estacionamentos e vias de acesso.
Isso é praticamente o máximo que se pode fazer – e na verdade era o máximo que se podia planejar para Fort Worth –, a menos que se assuma um trabalho muito mais vultoso do que plantar arbustos e instalar bancos. Esse trabalho é reduzir drasticamente o número de veículos na cidade.
Em seu plano para Fort Worth, Gruen teve de pressupor essa redução, muito embora a cidade fosse relativamente pequena e simples em comparação com nossas grandes cidades e muito embora as medidas com relação aos carros fossem amplas e complexas. O plano de Gruen incluía um serviço expresso de ônibus interligando o centro a toda a cidade e aos subúrbios e comportando um número muito maior de usuários do centro do que o atendido atualmente pelo transporte público. Sem esse serviço e sem aquela pressuposição, o plano da perimetral teria sido um bordado ilusório, como no padrão propositadamente ambicioso de Le Corbusier, ou então – encarando as dificuldades realisticamente – teria significado converter praticamente todo o centro em garagens e tornar inacessível a perimetral. Sem dúvida, um perímetro muito mais amplo poderia ter funcionado, com as garagens colocadas mais para fora, mas nesse caso malograria a formação de um distrito concentrado, ativo, acessível aos pedestres. O plano não teria sentido.
Algumas formas de separação do tráfego concebidas para ruas do centro muito congestionadas preveem não uma separação horizontal, como no plano de Gruen, mas uma separação vertical, ou com os pedestres colocados acima dos automóveis num nível superior da rua, ou os automóveis colocados acima dos pedestres. Porém, a remoção dos pedestres libera muito pouco espaço para os automóveis. Para fazer com que o leito das ruas tenha dimensão suficiente para os carros que trazem pedestres – o que é a causa do congestionamento e o motivo da separação –, é preciso ampliar a dimensão de áreas convenientes aos pedestres, até que se chega ao ponto em que não há comodidade para os pedestres. Também esses planos, para serem viáveis tanto para carros como para pedestres, devem contar com uma drástica redução no número de automóveis e uma dependência muito maior do transporte público.
E há ainda outra dificuldade nos planos para pedestres. As empresas urbanas que existem em função do uso das ruas pelos pedestres e que, de seu lado, geram um uso maior das ruas pelos pedestres, necessitam de um acesso adequado para veículos de serviço, abastecimento ou transporte de mercadorias.
Se o trânsito de veículos e de pedestres for inteiramente separado, uma destas duas alternativas é válida.
A primeira alternativa é que as ruas reservadas para os pedestres não contenham tais empresas. Isso é, de saída, um absurdo. Absurdos como esse existem na vida real e, como era de esperar, os espaços reservados ficam vazios. Os pedestres vão às ruas onde há trânsito de veículos, onde existam empresas. Essa espécie de contradição intrínseca atormenta grande parte do planejamento grandioso da “cidade do futuro”.
A outra alternativa é que se elaborem planos para os veículos de serviço, separados do espaço de pedestres.
O plano de Gruen para Fort Worth solucionava o problema do atendimento de serviço com um sistema de túneis subterrâneos para caminhões e para os táxis que servem a hotéis, com acesso pelo subsolo.
O plano também propunha, como variante, um sistema bastante avançado de “distribuição postal”, método também elaborado há muitos anos por Simon Breines, arquiteto de Nova York, num projeto para uma área de pedestres na faixa central de Nova York. A “distribuição postal” é um sistema de triagem centralizada de todas as entregas de carga e outras encomendas dentro de determinada zona. Reúnem-se por destinatário os materiais separados, de todos os tipos e de todas as procedências, e sua distribuição é racionalizada, num modelo muito parecido com aquele usado pelo correio para coletar e distribuir correspondência. Nesse caso, o objetivo é reduzir drasticamente o número de entregas com caminhões; as entregas (e os despachos), em número reduzido, podem então ser efetuadas quando o número de pedestres é baixo, de preferência à noite. A separação de pedestres e veículos, especificamente os caminhões, passa a ser principalmente uma separação horária, e não de espaço. Envolve uma despesa considerável, pois obriga a uma etapa a mais no manuseio de mercadorias.
A não ser nas áreas centrais de uso intenso, não há como justificar as dificuldades de serviço derivadas da completa separação entre pedestres e veículos.
Duvido que as vantagens da completa separação sejam muito grandes, em qualquer circunstância. O conflito entre pedestres e veículos nas ruas advém principalmente da quantidade esmagadora de carros, em favor dos quais todas as necessidades dos pedestres, exceto as mínimas, são sacrificadas constante e progressivamente. O problema do predomínio de veículos além do tolerável não diz respeito exclusivamente aos automóveis. Não há dúvida de que o número excessivo de cavalos gerava um conflito parecido; algumas pessoas que estiveram em Amsterdam ou em Nova Délhi, nos horários de tráfego intenso, dizem que assusta o número inacreditável de bicicletas que se mistura com os pedestres.
Quando há oportunidade, fico observando como as pessoas usam as ruas de pedestres. Elas não andam pelo meio, como se fossem enfim donas da rua. Elas andam pelas laterais. Em Boston, onde se fez a experiência de fechar duas ruas comerciais centrais (as entregas foram um problema complicado, é claro), era um espetáculo e tanto ver o leito das ruas quase vazio e as calçadas bem estreitas apinhadas de gente. Do outro lado do país, o mesmo fenômeno acontece na Rua Principal da Disneylândia, uma rua-modelo. Os únicos veículos que transitam nessa rua da Disneylândia são um bonde, que aparece em intervalos bem espaçados, para diversão e, de vez em quando, uma charrete puxada por cavalo. Ainda assim, os visitantes usam mais a calçada do que andam pelo meio da rua. As únicas vezes que eu os vi usando a rua foram, como num ato de rebeldia, quando um dos veículos ou um desfile estava passando. Aí eles iam se juntar ao que estava na rua.
Parte dessa inibição em Boston ou na Disneylândia pode ser provocada pelo fato de que todos nós fomos muito condicionados a respeitar o limite do meio-fio. Uma pavimentação que igualasse o nível da rua ao da calçada talvez induzisse mais pedestres a utilizar o espaço do leito carroçável; sem dúvida, nos lugares em que as calçadas são mais largas (mesmo em Boston), as pessoas não se aglomeram da maneira engraçada como fazem na Disneylândia ou nas calçadas estreitas do centro de Boston.
Contudo, essa é apenas uma parte da resposta. Nos shopping centers de subúrbio, onde as “ruas” são largas mas inteiramente de pedestres e sem meio-fio, as pessoas permanecem nas laterais, a não ser quando há alguma coisa interessante para ver que foi propositadamente colocada na “rua”. É necessária uma quantidade enorme de pedestres para encher toda a largura do leito da rua, mesmo quando dispersos. Parece que os únicos momentos em que os pedestres usam ou querem usar o leito da rua dessa maneira é quando há uma torrente incomum de pedestres, como no distrito de Wall Street ou na área financeira de Boston no final do expediente, ou durante o desfile de Páscoa na Quinta Avenida. Em circunstâncias mais comuns, as pessoas são atraídas para as laterais porque aí, acho eu, é mais interessante. Enquanto andam, elas se entretêm em olhar – as vitrines, os prédios, umas às outras.
Todavia, as pessoas nas ruas de pedestres de Boston, da Disneylândia ou dos shopping centers se comportam de modo diferente num aspecto das pessoas nas ruas comuns da cidade onde o uso de veículos é intenso. Essa exceção é significativa. As pessoas atravessam de um lado para o outro livremente e, ao exercer essa liberdade, não se mostram inibidas pelos meios-fios. Essas observações, somadas ao costume das pessoas de atravessar a rua em lugares proibidos, correndo o risco de serem pegas no erro – e também de pagar com a vida – e somadas à visível impaciência que as pessoas quase sempre demonstram nos cruzamentos, levam-me a acreditar que a maior virtude das ruas de pedestres não é a de não circularem veículos, mas sim a de não serem sufocadas e dominadas por uma inundação de carros e serem mais fáceis de atravessar.
Mesmo com relação às crianças, o problema pode ser menos o de afastar os carros que de reduzir seu predomínio e combater a perda do espaço de lazer nas calçadas provocada por eles. É claro que o ideal seria remover todos os carros das ruas em que as crianças brincam; mas haverá mais problemas se isso significar remover as outras funções utilitárias das calçadas e, junto com elas, a vigilância. Às vezes, também esses planos se anulam automaticamente. Um conjunto habitacional imobiliário de Cincinnati é um exemplo. As casas desse conjunto voltam-se para áreas de pedestres com gramados e calçadas e têm, nos fundos, vielas para carros e entregas. Todo o vaivém normal acontece entre as casas e as vielas e, portanto, funcionalmente, os fundos tornaram-se a frente das casas, e vice-versa. É claro que é nas vielas que as crianças ficam.
Vida atrai vida. Essas soluções não são apreciadas nos locais em que a separação dos pedestres
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feita como um capricho desligado da realidade, e muitas atividades não são atendidas ou são suprimidas para que esse capricho dê certo.
Pensar nos problemas de trânsito da cidade em termos tão simplificados, de pedestres contra carros, e fixar como objetivo principal a separação deles é abordar o problema pelo lado errado. Não se pode separar a consideração pelos pedestres nas cidades da consideração pela diversidade, pela vitalidade e pela concentração de usos urbanos. Na ausência da diversidade urbana, as pessoas que vivem em grandes comunidades provavelmente se saem melhor com um carro do que a pé. Vazios urbanos insolúveis não são de forma alguma preferíveis ao trânsito urbano insolúvel.
O problema que está por trás da consideração pelos pedestres, e também por trás de todas as dificuldades do trânsito urbano, é como reduzir o número de veículos nas ruas e fazer com que os restantes trabalhem mais e com mais eficiência. A dependência excessiva dos automóveis particulares e a concentração urbana de usos são incompatíveis. Um ou outro tem de ceder. Na prática, é isso o que acontece. Dependendo de qual das pressões tenha mais sucesso, ocorre um destes dois processos: erosão das cidades pelos automóveis ou redução dos automóveis pelas cidades.
Antes de compreender os prós e contras de quaisquer táticas de trânsito urbano, precisamos entender a natureza desses dois processos e suas implicações. Precisamos também saber que o trânsito nas cidades exerce uma pressão sobre si mesmo. Os veículos brigam entre si por espaço e pela conveniência das soluções. Eles também brigam com outros usos por espaço e conveniência.
A erosão das cidades pelos automóveis provoca uma série de consequências tão conhecidas que nem é necessário descrevê-las. A erosão ocorre como se fossem garfadas – primeiro, em pequenas porções, depois uma grande garfada. Por causa do congestionamento de veículos, alarga-se uma rua aqui, outra é retificada ali, uma avenida larga é transformada em via de mão única, instalam-se sistemas de sincronização de semáforos para o trânsito fluir rápido, duplicam-se pontes quando sua capacidade se esgota, abre-se uma via expressa acolá e por fim uma malha de vias expressas. Cada vez mais solo vira estacionamento, para acomodar um número sempre crescente de automóveis quando eles não estão sendo usados.
Nenhuma etapa desse processo é, em si, crucial. Mas o efeito cumulativo é enorme. E cada etapa, que de forma isolada não é crucial, é crucial no sentido de que não só acrescenta seu quinhão à mudança total, mas também acelera o processo. A erosão das cidades pelos automóveis é um exemplo do que é conhecido como “retroalimentação positiva”. Na retroalimentação positiva, uma ação produz uma reação que por sua vez intensifica a situação que originou a primeira ação. Isso intensifica a necessidade de repetição da primeira ação, que por sua vez intensifica a reação e assim por diante, ad infinitum. É mais ou menos como adquirir um vício pelo hábito.
Uma declaração notável a respeito do processo de retroalimentação positiva do tráfego – ou de parte dele – foi feita por Victor Gruen em 1955, no contexto de seu plano para Fort Worth. Para compreender a dimensão do problema que enfrentava, Gruen projetou para 1970 o potencial comercial do então pouco desenvolvido e estagnado – mas congestionado – centro de Fort Worth, baseado na previsão da população e na área de comércio. Ele transformou então esse volume de atividade econômica em número de usuários, incluindo trabalhadores, lojistas e visitantes. Depois, usando o índice atual de veículos por frequentadores do centro de Fort Worth, transformou o número de supostos futuros usuários em número de veículos. Em seguida, calculou a quantidade de espaço na rua necessário para atender ao número de veículos que poderiam estar nas ruas ao mesmo tempo.
Gruen chegou a um número impensável de espaço viário necessário: 1.500.000 metros quadrados, sem incluir áreas de estacionamento. Isso em comparação com os 460 mil metros quadrados de leito carroçável que o centro pouco desenvolvido possui hoje. Para ter esse espaço viário, o centro precisaria expandir-se enormemente. Em consequência disso, os usos comerciais ficariam com uma distribuição muito pouco concentrada. Para ir a esses lugares diferentes, as pessoas caminhariam muito menos e dependeriam muito mais dos automóveis. Isso aumentaria a necessidade de mais espaço viário, ou então o congestionamento seria monstruoso. Os usos diferentes, forçosamente muito mais dispersos, estariam tão distantes entre si, que seria imprescindível duplicar o espaço de estacionamento, porque os usos que atrairiam as pessoas em horários diferentes não se encontrariam próximos a ponto de permitir um uso contínuo da mesma infraestrutura2. Isso significaria dispersar ainda mais o centro, o que por sua vez exigiria um uso mais intenso de carros, que percorreriam dentro dele distâncias ainda maiores. Bem no início do processo, o transporte público seria completamente ineficiente, tanto para os passageiros quanto para o proprietário da empresa. Em síntese, não existiria coesão no centro, mas uma mancha grande, esparsa, incapaz de gerar para a população e a economia em questão os recursos, a diversidade e as opções metropolitanas teoricamente possíveis.
Como assinalou Gruen, quanto mais espaço se der aos carros nas cidades, maior se tornará a necessidade do uso dos carros e, consequentemente, de ainda mais espaço para eles.
Na prática, não é possível saltar de repente de 460 mil metros quadrados de espaço viário para 1.500.000 metros quadrados, e assim fica mais difícil perceber as implicações de acomodar mais carros, mais carros e mais carros. Porém, a retroalimentação positiva está atuando, rápida ou lentamente. Rápida ou lentamente, a maior facilidade de acesso com carro é inexoravelmente acompanhada tanto de menor disponibilidade e eficiência do transporte público quanto do escasseamento e da dispersão de usos e, em decorrência disso, da maior necessidade de carros.
O extremo do paradoxo de aumentar a facilidade de acesso com carro e reduzir a intensidade de usuários pode ser constatado em Los Angeles e quase na mesma intensidade em Detroit. Porém, essa relação é igualmente implacável em cidades que estão na etapa inicial do processo de “erosão”, onde apenas uma minoria de usuários é atendida pelo aumento do fluxo do trânsito. Manhattan é exemplo disso. Um método aí adotado para atenuar o congestionamento de veículos é aumentar a velocidade do trânsito fazendo as largas avenidas norte-sul fluírem num único sentido. Os ônibus, em vez de rodar nos dois sentidos numa avenida, precisam, é claro, como os outros veículos, andar para o norte numa avenida e para o sul em outra. Isso quase sempre significa para os passageiros uma caminhada forçada de duas quadras longas para pegar o ônibus correto.
Não surpreende que, quando uma avenida passa a fluir num único sentido em Nova York, haja uma redução de passageiros de ônibus. Para onde eles vão? Ninguém sabe, mas a hipótese da companhia de ônibus é que essa parcela de passageiros é formada por pessoas que têm outra opção. Alguns, segundo os funcionários da companhia, ficam entre usar os ônibus ou o carro particular; outros, que viriam de fora do distrito, ficam indecisos entre valer ou não a pena vir ao distrito, e pode haver outras opções, como não viajar de ônibus dentro do distrito. Seja qual for a opção, as vantagens de comodidade foram alteradas a ponto de essas pessoas mudarem de ideia. O que é inquestionável é que o aumento do fluxo de veículos, com seu efeito colateral sobre o transporte público, coloca em jogo um aumento do número de veículos. Ele também reduz a comodidade dos pedestres ao obrigar a uma espera mais longa do que antes nos cruzamentos das avenidas que sofreram mudança.
Com um e outro paliativo, Manhattan possibilitou, no período de oito anos de 1948-56, a entrada diária de mais 36 por cento de veículos, embora isso represente apenas uma pequena parcela das pessoas de fora que vêm a Manhattan, 83 por cento das quais chegam de transporte público. Durante esse mesmo período houve uma queda de 12 por cento no número de passageiros de ônibus vindos de fora, provocando um “déficit” de cerca de 375 mil pessoas de fora por dia. O aumento da facilidade de acesso com carro é sempre acompanhado de uma queda no serviço de transporte público. O decréscimo de passageiros de coletivos é sempre maior que o acréscimo de passageiros de carros particulares. Com a maior facilidade de acesso com carros ao distrito, a interação de usos provocada pelas pessoas no distrito invariavelmente diminui, e isso é um problema sério para as cidades, onde uma das mais importantes funções do transporte é permitir e encorajar a interação de usos.
Resultados como esse – acessibilidade maior, intensidade menor – provocam pânico em muita gente. A medida costumeira para enfrentar a queda na intensidade de uso é o aumento ainda maior da acessibilidade com carros – geralmente facilitando-lhes, em primeiro lugar, o estacionamento. Assim, utilizando outro exemplo de Manhattan, uma das medidas veementemente recomendadas pelo diretor de trânsito como paliativo para os magazines é uma série de pátios de estacionamento municipais. Essa medida abocanharia cerca de dez quadras do solo da faixa central de Manhattan, atingindo muitas centenas de pequenos negócios3.
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assim que a erosão diminui, pouco a pouco, os motivos para se usar um distrito corroído e ao mesmo tempo o torna menos vivo, menos conveniente, menos adensado e menos seguro para aqueles que continuam a ter motivos para frequentá-lo. Quanto maior for a concentração e o genuíno caráter urbano de uma área, maior será o contraste entre o pouco que se ganha e o muito que se perde com o processo de erosão.
Se o trânsito de veículos nas cidades representasse um volume constante de necessidades, a iniciativa de atendê-las produziria uma reação boa e gratificante. Afinal alguma coisa seria solucionada. Porém, como os paliativos fazem aumentar a necessidade de mais veículos, nunca se chega à solução.
Mesmo assim, em algum momento a solução deveria ser pelo menos teoricamente possível – um momento em que a acessibilidade crescente e a intensidade de uso decrescente chegassem a um equilíbrio ou a uma equiparação. Nesse momento, o problema do trânsito deveria estar resolvido, no sentido de que não haveria mais incômodo com a lentidão e a falta de espaço para o estacionamento de veículos. Em face da erosão progressiva, a pressão do trânsito sobre várias partes da cidade deveria equilibrar-se, e então a expansão contínua deveria atender a essa pressão equilibrada. Ao se tornar uma mancha bem homogênea e esparsa, a cidade precisa ter controle sobre o problema do trânsito, seja ele qual for. Um estado de equilíbrio como esse é a única solução possível num processo de retroalimentação positiva como a erosão urbana.
Nenhuma cidade norte-americana atingiu ainda esse ponto de equilíbrio. Os exemplos reais de cidades grandes que sofreram erosão ilustram, até agora, só o estágio de pressão crescente. Poderia parecer que Los Angeles está chegando ao ponto de equilíbrio porque 95 por cento das viagens dentro dessa cidade são feitas com automóveis particulares. No entanto, mesmo assim, as pressões ainda não estão bem equilibradas, porque 66 por cento das pessoas que vão ao centro erodido e sem vida de Los Angeles ainda usam transporte público. Quando uma greve de funcionários de trânsito de Los Angeles, em 1960, levou às ruas mais carros do que o normal, fotos aéreas mostraram vias expressas e também ruas congestionadas ao máximo, com os carros colados uns aos outros, e os noticiários disseram que houve brigas de socos entre motoristas nervosos com a falta de lugar para estacionar. O sistema de trânsito de Los Angeles, outrora considerado o melhor dos Estados Unidos (alguns especialistas dizem que do mundo), decaiu tanto, que faz lembrar um transporte público lento e inadequado, mas obviamente continua tendo um contingente de usuários para os quais não há espaço nas vias expressas e nos estacionamentos. Além do mais, a pressão por estacionamento continua, no geral, subindo. Há poucos anos, quem se mudava de volta para a “cidade” achava que duas vagas de garagem por apartamento eram mais que suficientes. Hoje, os novos prédios oferecem três vagas por apartamento – uma para o marido, outra para a mulher e uma média de uma vaga por apartamento para outros familiares ou visitantes. Menos que isso, é impossível, numa cidade onde é difícil comprar um maço de cigarros sem usar o automóvel; e, quando alguém dá uma festa, mesmo a cota média de três vagas de garagem por apartamento é insuficiente. E também a pressão dos carros em trânsito ainda não baixou para um estado normal, comum. Como escreveu Harrison Salisbury no New York Times:
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comum o trânsito das vias expressas de Los Angeles parar por causa de acidentes. O problema é tão crônico, que os técnicos têm sugerido que os carros imobilizados sejam retirados com helicóptero. A verdade é que uma charrete a cavalo conseguia atravessar Los Angeles quase tão rápido em 1900 quanto um automóvel atualmente, às cinco horas da tarde.
O ponto de equilíbrio, onde quer que se encontre, está além do ponto em que são gerados problemas ainda mais graves do que os engarrafamentos de trânsito. Está além do ponto em que as pessoas que andam a pé nas ruas se sentem seguras em relação a outras pessoas. Está além do ponto em que a vida pública urbana é normal. Está bem além do ponto em que há qualquer relação entre investimento e eficiência. Citando Salisbury de novo:
O ruim é que, quanto mais espaço se dá aos automóveis, a galinha dos ovos de ouro acaba estrangulada. Áreas enormes são retiradas da receita tributária e se tornam imprestáveis para fins economicamente produtivos. Diminui a capacidade da coletividade de pagar os custos sempre crescentes das vias expressas (…). Ao mesmo tempo, o fluxo do trânsito torna-se cada vez mais imprevisível (…). É de Los Angeles que vêm os apelos mais angustiados para sair desse pesadelo sobre rodas. É Los Angeles que ameaça não licenciar carros novos sem equipamentos que evitem a descarga de partículas de hidrocarbonetos responsáveis pela poluição (…). É em Los Angeles que as autoridades responsáveis dizem que o sistema está acabando com os elementos necessários à vida humana – terra, ar e água.
Los Angeles não pretendia cultivar esses problemas, assim como Nova York, Boston, Filadélfia
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Pittsburgh, consumindo-se em vias expressas, não pretendem retalhar-se e definhar. É dado um passo supostamente lógico após o outro, cada um deles plausível e aparentemente justificável; e o resultado singular é uma cidade que não é mais fácil de usar e não facilita a locomoção, mas, ao contrário, é mais dispersa, mais incômoda, provoca desperdício de tempo, encarece e dificulta a combinação de usos. Um industrial de Nova York que visita a negócio outras cidades contou-me que precisa do dobro do tempo em Los Angeles, e em São Francisco e Nova York, para fazer um número determinado de visitas e terminar o trabalho. O diretor da filial de Los Angeles de uma firma de consultoria contou-me que precisa ter dois funcionários a mais do que em Chicago para fazer o mesmo número de contatos a mesma distância.
Todavia, embora a erosão não resolva nada e provoque grande ineficiência, nunca há um ponto bom ou óbvio para dar um basta. Isso porque, à medida que o processo avança, depois de um começo trivial e supostamente inócuo, torna-se mais difícil e, pelo menos aparentemente, impossível sustá-lo ou revertê-lo.
As táticas de erosão, que destroem as cidades e não conseguem solucionar coisa alguma, não podem, no entanto, ser culpadas por todos os embaraços e pelas dificuldades e custos crescentes do tráfego urbano. Muitos distritos urbanos sem o benefício de erosão são dispersos e pouco práticos para uso, a não ser com automóveis particulares, e isso sempre ocorreu, mesmo antes dos automóveis.
Todos nós conhecemos a necessidade dos automóveis nos subúrbios. Geralmente as mulheres que moram em subúrbios fazem uma quilometragem diária maior do que seus maridos nas viagens entre o trabalho e a residência. O aumento do espaço de estacionamento também é comum nos subúrbios: as escolas, os supermercados, as igrejas, os shopping centers, os postos de saúde, o cinema, todas as residências precisam ter vagas próprias de estacionamento, e todo esse espaço ampliado de estacionamento fica sem uso a maior parte do tempo. Os subúrbios, pelo menos enquanto forem subúrbios, podem manter esse desperdício do solo e esse índice de viagens com automóveis particulares devido à sua falta de concentração. (Aqui se encontra aparentemente aquele enganoso ponto de equilíbrio; no entanto, no momento em que se introduz o trabalho nessa mistura, mesmo num subúrbio, o equilíbrio se desfaz.)
Exatamente a mesma premência, tanto de automóveis como necessidade constante quanto de área de estacionamento ampliada, pode existir nas cidades que não dispõem das condições para gerar diversidade urbana – aí incluída densidade suficientemente alta. “Sou a única na família que viaja de um lado para o outro”, diz minha amiga Kostritsky. Os Kostritskys moram na área central de Baltimore, perto do trabalho do marido. Mas ela, que usa o carro (não há jeito mais prático), precisa “viajar” para levar as crianças à escola; para fazer compras grandes, que não sejam só um pão, uma lata de sopa e um pé de alface; para ir à biblioteca, assistir a um espetáculo, ir a encontros. E, como qualquer mãe que ainda more nos subúrbios, também ela, que mora na zona central, precisa ir a um shopping center de subúrbio para comprar roupas para os filhos. Não que não existam dessas lojas perto da casa dela, mas as lojas do centro não têm mais uma demanda que justifique manter um estoque variado de roupas infantis. De noite, é perigoso sair se não for de carro. A falta de atrativos no distrito, além do mais, não justifica um transporte coletivo adequado, dentro do próprio distrito ou para outros lugares da cidade, e isso não seria diferente se os automóveis não existissem.
Esse tipo de bairro obriga ao mesmo uso constante de automóveis que um subúrbio. Mas, por outro lado, ao contrário dos subúrbios, a concentração de pessoas é excessivamente alta para a infraestrutura de que um subúrbio dispõe para carros e estacionamento. As densidades intermediárias
– excessivamente baixas para cidades e excessivamente altas para subúrbios – são ruins para o transporte assim como para outras atividades econômicas e sociais.
Atualmente, o destino desses distritos é serem abandonados pelas pessoas com poder de escolha, em qualquer caso. Se forem herdados por pessoas muito pobres, as dificuldades de transporte e de uso podem não causar problemas de trânsito sérios, porque os habitantes talvez não tenham dinheiro para comprar carros. Quando tiverem, a tendência será mudar de bairro.
Porém, quando esses distritos são intencionalmente “reurbanizados para atrair de novo a classe média”, ou preservados para reter uma população que ainda não foi embora, a necessidade de prover uma infraestrutura para carros torna-se prioritária. A monotonia e a escassez de usos são, assim, reforçadas.
A Grande Praga da Monotonia anda de mãos dadas com a praga do congestionamento de trânsito.
Quanto mais áreas monótonas, planejadas ou espontâneas, existirem, maior se torna a pressão do trânsito sobre os distritos movimentados. As pessoas que precisam usar automóvel para percorrer a monótona área onde moram na cidade ou sair dela não estão sendo simplesmente caprichosas ao ir de carro a um lugar em que ele é desnecessário, prejudicial e um estorvo para os próprios motoristas.
Devem-se dar às áreas acometidas com a Grande Praga da Monotonia as condições que lhes faltem para gerar diversidade. Essa é sua necessidade básica, a despeito do trânsito. Contudo, é inútil executar essa meta se se encara como prioritária a tarefa de prover infraestrutura para um volume enorme de carros e se relegam a segundo plano outros usos urbanos. Uma estratégia fundada na erosão pelos automóveis não só destrói a intensidade urbana já existente como também se choca com o desenvolvimento de uma intensidade de usos nova ou complementar onde ela seja necessária.
As várias modalidades de usos e interesses urbanos sempre se chocam com o processo de erosão. Um dos motivos de esse processo ocorrer de forma tão progressiva na maioria das cidades é o custo exorbitante da incorporação de tanto solo que já tem outra destinação. Porém, a existência de outros fatores, além das despesas, exerce pressão sobre um fluxo constante de veículos. Um desses fatores de pressão é, por exemplo, o grande número de esquinas onde os pedestres atravessam as ruas.
Para se ter uma ideia clara do conflito entre a pressão para acomodar mais veículos e a pressão exercida por vários outros usos, basta assistir a uma audiência pública sobre alargamento de ruas, traçado de uma via expressa, uma via de acesso para uma ponte, uma rua num parque, conversão do tráfego para mão única, um novo conjunto de estacionamentos públicos ou qualquer outra proposta de erosão defendida pelo governo que exija uma audiência.
Essas audiências revelam um ponto de vista diferente do defendido pelos mentores da erosão. Os munícipes cujo bairro ou propriedade serão atingidos geralmente comparecem para combater o plano, às vezes protestando não só de viva voz ou por meio de petições, como também com manifestações e cartazes4. Eles em geral repetem a mesma linha de raciocínio contra a erosão que apresentei, citando Salisbury ou Gruen ou o livro de Wilfred Owens, Cities in the Motor Age [As cidades na era do motor], ou os argumentos de Lewis Mumford sobre equilíbrio e variação do tráfego.
No entanto, as generalidades e a filosofia sobre a direção para onde caminham as cidades não são realmente o cerne da argumentação dos habitantes, nem essa observação dá conta das questões mais ardorosas e convincentes que eles defendem.
A verdadeira crítica dos moradores é à destruição localizada que será imposta a suas casas, suas ruas, seus negócios, sua comunidade. Quase sempre os funcionários públicos de baixo escalão eleitos por sua área comparecem para reforçar o protesto; se não o fizessem, nunca seriam reeleitos.
Os planejadores, os diretores de trânsito, os funcionários eleitos de alto escalão e outras pessoas desconhecidas do topo da máquina municipal já esperam essa reação. Eles sabem tudo sobre esses manifestantes: pessoas bem-intencionadas, mas, na ordem das coisas, sem conhecimento desses problemas, preocupadas com interesses locais, incapazes de ver “o quadro como um todo”.
Mas vale a pena ouvir o que esses moradores têm a dizer.
A própria veracidade e objetividade da argumentação deles sobre as consequências concretas e localizadas é, penso eu, a saída para evitar que as cidades sejam destruídas pelo trânsito, questão que abordarei em breve. É também um lembrete de que a erosão é impopular para um número enorme de habitantes, por motivos bastante compreensíveis.
Se os protestos, a necessidade das próprias audiências e as despesas diretas exigidas pelas várias mudanças erosivas representam algumas das formas de pressão que as cidades exercem sobre o processo de erosão, eles não representam a reversão desse processo. Representam, no máximo, um empate.
Se, porém, o sucesso de outras pressões sobre o trânsito for levado um pouco adiante, com o fim de diminuir o trânsito de veículos, então teremos um exemplo de redução do número de automóveis provocada pelas cidades.
Atualmente, a redução dos automóveis pelas cidades é quase sempre acidental. A redução, ao contrário da erosão, raramente é planejado por alguém nem é reconhecida ou praticada como política. Mesmo assim, ela ocorre.
Muitas de suas manifestações são efêmeras. Por exemplo, quando um teatro experimental foi aberto na esquina de várias ruas estreitas do Greenwich Village, a intensidade de uso nesse local, entre os atos e depois da peça, parou o trânsito. Os espectadores usavam a rua como se fosse um saguão ao ar livre, porque a calçada era muito estreita, e demoravam a abrir caminho para os carros. Uma rua muito mais larga de Nova York costuma ser bloqueada na hora da saída de espetáculos noturnos no Madison Square Garden. A pressão da multidão é tão grande, que as pessoas ignoram a prerrogativa dos motoristas. Elas não respeitam a vez dos carros nos semáforos. O trânsito fica parado por várias quadras. Em qualquer um desses casos, se os motoristas decidirem não vir de carro da próxima vez, estará ocorrendo um enfraquecimento de carros, ainda que passageiro.
Outra forma comum de redução de carros ocorre na zona de comércio de roupas de Nova York, onde é intenso o tráfego de caminhões. Esses caminhões, que brigam por um espaço na rua, mal cumprem o trabalho; são tão numerosos, que tornam precárias as condições de trânsito para qualquer veículo. As pessoas que usam carros particulares já sabem que devem evitar a zona do comércio de roupas. Quando elas tomam a decisão de andar a pé ou usar o metrô para ir aonde querem, está havendo uma redução de carros. A enorme dificuldade de transitar de táxi ou em carro particular nessa zona de comércio de roupas fez com que a maioria das indústrias têxteis de Manhattan, que costumavam instalar-se num bairro tranquilo na parte baixa da ilha, resolvesse mudar-se para a zona do comércio de roupas, aonde seus fregueses podem chegar a pé. Ao mesmo tempo que uma transferência dessas provoca o aumento da concentração e da intensidade do uso do solo, ela reduz o uso de automóveis, constituindo um exemplo de pressão a ponto de diminuir a necessidade do uso de carros.
A redução de automóveis pela cidade é tão raramente planejada, que é difícil encontrar exemplos recentes. (O fechamento de ruas para uso exclusivo de pedestres, geralmente acompanhado de uma compensação para os veículos, não significa redução de carros, mas reordenamento do trânsito.) Porém, há o exemplo da proibição de automóveis no Washington Square Park, em Nova York, em vigor desde 1958, e vale a pena examiná-lo.
O Washington Square Park, com cerca de 2,8 hectares, delimita a ponta sul da Quinta Avenida. Todavia, até 1958, ele não delimitava o tráfego norte–sul da Quinta Avenida. Uma via na sequência, originalmente uma rua de parque, levava os veículos através do parque entre o final da Quinta Avenida e outras ruas no sentido norte–sul depois do parque.
Com os anos, é claro que o tráfego aumentou gradativamente nessa rua do parque, o que era sempre um incômodo para as pessoas que costumavam frequentá-lo. Lá pelos anos 1930, Robert Moses, então diretor de parques, tentou acabar com essa rua. Porém, seu plano consistia em compensar isso – muito mais do que compensar – reduzindo a orla do parque para alargar as estreitas ruas perimetrais e, assim, circundar o parque com uma artéria principal de alta velocidade. Esse esquema, batizado pelos moradores de “plano do tapete de banheiro” (referindo-se ao que restaria do parque), foi combatido e derrotado. Impasse.
Depois, em meados dos anos 50, Moses apresentou um novo plano para a erosão. Este consistia numa autopista rebaixada cortando o parque ao meio, uma ligação que comportaria um grande volume de tráfego de alta velocidade entre a faixa central de Manhattan e uma vasta, sonolenta Ville Radieuse e via expressa que Moses tramava construir ao sul do parque.
Primeiramente a maioria dos moradores locais se opôs à proposta da autopista rebaixada, precipitando nada mais que outro impasse. No entanto, duas mulheres ousadas, as senhoras Shirley Hayes e Edith Lyons, tiveram um raciocínio menos conservador. Fizeram um progresso notável ao conceber melhorias para certas atividades urbanas, como lazer de crianças, caminhadas e lazer de adultos, em detrimento do trânsito de veículos. Elas defendiam a extinção da rua do parque, ou seja, fechar o parque ao tráfego de automóveis, mas também, ao mesmo tempo, não alargar as ruas perimetrais. Em resumo, propunham o fechamento da rua do parque sem compensação alguma.
A ideia delas ganhou adeptos; as vantagens para quem usava o parque eram evidentes. Além do mais, as cabeças pensantes da comunidade começaram a perceber que dessa vez não havia possibilidade de novo impasse. Isso porque, quando as outras etapas do esquema Ville Radieuse-Via Expressa do diretor Moses fossem desenvolvidas, a rua que atravessava o parque começaria a receber automóveis numa quantidade compatível com uma autopista. Percebeu-se que a velha rua, embora já fosse um incômodo, era usada bem abaixo de sua capacidade, e seria bem diferente e mais insuportável que ela desse vazão a parte do fluxo que se dirigiria à futura via expressa.
Em vez de ficar na defensiva, a opinião majoritária na comunidade passou à ofensiva.
As autoridades municipais insistiram em que, se a rua fosse fechada – medida que eles pareciam considerar absurda –, a única alternativa possível seria alargar as ruas no perímetro do parque, senão elas sofreriam um congestionamento monstruoso e enervante. A Comissão de Planejamento, depois de uma audiência, refutou as propostas de fechamento e aprovou em seu lugar o que seus membros chamaram de “pista de rolamento mínima” através do parque, sob o argumento de que, se a comunidade impusesse sua proposta absurda, todos os cidadãos seriam prejudicados. As ruas à volta do parque, disseram eles, ficariam congestionadas com o trânsito desviado. O diretor de trânsito previu um aumento imediato de milhões de carros por ano nas ruas próximas. Moses prognosticou que, se a comunidade impusesse sua proposta, mais cedo ou mais tarde os cidadãos viriam até ele implorar pela reabertura da rua e pela construção da autopista, e a confusão em que eles se meteriam seria merecida e lhes serviria de lição.
Todas essas previsões calamitosas certamente se tornariam realidade se fosse feita a compensação para os carros desviados do parque. No entanto, antes que qualquer esquema alternativo fosse executado – até mesmo um esquema para acelerar o fluxo nas ruas perimetrais existentes –, a comunidade, exercendo repentinamente forte pressão política, conseguiu fechar a rua do parque, primeiro como experiência, depois permanentemente.
Não se confirmou nenhuma das previsões de aumento de trânsito à volta do parque. Nem poderiam confirmar-se, porque essas ruas perimetrais, estreitas, cheias de semáforos, lotada de carros estacionados, com pedestres que as atravessam onde querem, repleta de esquinas difíceis de contornar, já eram um dos percursos mais problemáticos e lentos para os automóveis. O percurso através do parque, aquele que estava sendo fechado, era o melhor e mais rápido no sentido norte–sul.
Todas as contagens de veículos feitas à volta do perímetro do parque desde o fechamento da rua não indicaram aumento algum no trânsito; a maioria das contagens indicou uma pequena redução. Na parte de baixo da Quinta Avenida, o número de veículos caiu de forma substancial; aparentemente, uma parcela considerável desse tráfego devia-se àqueles que atravessavam o parque. Em vez de trazer novos problemas de congestionamento, o obstáculo do parque resultou num pequeno alívio do engarrafamento precedente.
Para onde foram os milhões de veículos por ano do diretor de trânsito?
Essa é a parte mais interessante e significativa da história. Aparentemente, não foram para lugar algum. As avenidas contínuas a leste e a oeste da Quinta Avenida e paralelas a ela, que deveriam receber o impacto do volume de trânsito desviado, parecem não ter recebido carros a mais. Pelo menos não teve alteração o tempo de viagem dos ônibus, um bom parâmetro para aumentos e quedas no volume de tráfego. Nem os motoristas perceberam diferença alguma. (O diretor de trânsito, que dispõe de todos os recursos para fazer contagens na área necessária e estudos de viagens do ponto de saída ao ponto final, mostrou pouco interesse em descobrir para onde se dirigira a profusão de carros desaparecidos. Ele não gosta de tocar no assunto.)
Como os passageiros de ônibus que desapareceram das avenidas de mão única, esses carros – ou alguns carros – sumiram sem deixar pistas. Seu sumiço não é mais misterioso nem menos esperado que o dos passageiros de ônibus. Da mesma forma que não existe um número absoluto, imutável, de passageiros de transporte coletivo numa cidade, não existe um número absoluto, imutável, de pessoas que andam em carros particulares; ao contrário, os números variam de acordo com os diferenciais momentâneos de velocidade e de conveniência dos meios de locomoção.
Ocorre uma pressão sobre os automóveis quando se criam condições menos favoráveis a eles. A pressão como um processo constante, gradual (coisa que não existe atualmente), provocaria um decréscimo constante do número de pessoas que usam automóveis particulares na cidade. Se executada corretamente – como um fator de estímulo à diversidade e de intensificação do uso urbano –, a pressão diminuiria a necessidade de carros simultaneamente à redução das condições favoráveis a eles, tanto quanto, no caso reverso, a erosão aumenta a necessidade de carros simultaneamente ao aumento das condições favoráveis a eles.
Na vida real, que é bem diferente da vida nas cidades imaginárias, a redução dos automóveis pelas cidades talvez seja a única maneira de reduzir o número total de veículos. É, provavelmente, a única maneira realista de estimular melhor o transporte público e, ao mesmo tempo, promover e prover um uso urbano com maior intensidade e vitalidade.
No entanto, a estratégia de pressão da cidade sobre os automóveis não pode ser arbitrária nem negativa. Além disso, uma política como essa não é capaz de dar resultados espetaculares de uma hora para outra. Embora seus efeitos cumulativos possam ser revolucionários, ela precisa, como qualquer estratégia que vise manter as coisas funcionando, estar inserida num processo evolutivo.
Quais as táticas apropriadas a uma estratégia de pressão da cidade sobre os automóveis pelas cidades? Muitas das táticas ficam óbvias de imediato, desde que entendamos que a questão não é a redução de automóveis nas cidades, mas a redução de automóveis pelas cidades. Táticas apropriadas são aquelas que dão espaço a outros usos urbanos necessários e desejados, que rivalizam com as necessidades viárias dos automóveis.
Considerem, por exemplo, o problema de atender aos usos que as pessoas tentam dar às calçadas das ruas mais atraentes, de mostruários do comércio a brincadeiras infantis. Para isso, as calçadas largas são imprescindíveis. Além do mais, certas calçadas ficariam muito bem com fileiras duplas de árvores. Um técnico preocupado com a redução de automóveis daria preferência às calçadas que têm uso constante e variado e procuraria alargá-las e intensificar seu uso, tendo por meta o desenvolvimento da vida urbana. Assim, o leito da rua seria automaticamente estreitado.
Quando nossas cidades souberem incentivar deliberadamente os quatro geradores fundamentais de diversidade, surgirão cada vez mais ruas interessantes e atraentes. A ampliação das calçadas deve ser feita tão logo essas ruas o mereçam, pelo seu uso.
De onde viria o dinheiro? Do mesmo lugar que ele vem hoje para ser mal empregado no estreitamento das calçadas5.
Há muitas variantes para a redução física do leito das ruas em proveito de outros usos já patentes. Os pontos de grande aglomeração, com exceção de escolas, alguns teatros e alguns grupos de lojas, poderiam ganhar espaços externos que avançassem parcialmente sobre o leito da rua, transformando a pressão de efêmera em permanente. Os parques pequenos poderiam avançar sobre as ruas, criando dessa forma becos sem saída. Mesmo assim o trânsito de veículos em qualquer sentido seria permitido, mas se evitaria um fluxo contínuo, exceto em situações de emergência. As ruas de parque poderiam ser fechadas, como na Washington Square, desde que os parques tivessem um uso que o justificasse.
Além dessas e de outras variantes de intromissão no leito da rua, as quadras curtas (e portanto com muitas travessas), sempre necessárias para gerar diversidade, também influem no fluxo de trânsito.
No próximo capítulo, sobre ordem visual, farei outras sugestões específicas de táticas que ao mesmo tempo são benéficas para a vida urbana e dificultam o trânsito de automóveis. São infinitas as possibilidades de aumentar o conforto, a intensidade e a vivacidade das ruas, restringindo simultaneamente os automóveis. Hoje excluímos automaticamente, às vezes com pesar, a maioria das comodidades – para não falar nas necessidades funcionais, tais como pontos frequentes e acessíveis para a travessia de pedestres –, porque eles entram em conflito com a voracidade e a insaciabilidade das necessidades dos automóveis. O conflito é real. Não é preciso inventar táticas artificiais.
E também não é preciso impingir essas melhorias onde elas não são esperadas. Elas deveriam ser introduzidas em ruas e distritos onde uma quantidade considerável de pessoas apreciasse e aproveitasse essas mudanças, não em ruas ou distritos em que não se faça uso delas.
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tão próxima, e orgânica, a relação dos distritos urbanos vivos, variados, com a redução do número de veículos que utilizam as ruas, que, a não ser por um impedimento grave, uma boa estratégia de combate poderia basear-se simplesmente no desenvolvimento de distritos vivos e atraentes, sem de forma alguma ignorar os efeitos correlatos sobre o tráfego de automóveis, o qual seria automaticamente reduzido.
A redução deve ser alcançada com certa seletividade. Como mencionei anteriormente neste capítulo, o trânsito exerce pressão sobre si mesmo; os veículos competem não só entre si como também com outros usos. Da mesma maneira que os outros usos e o trânsito se adaptam e se ajustam, dando origem, assim, ao processo de erosão da cidade ou de redução de automóveis, os veículos adaptam-se e ajustam-se à presença uns dos outros. Por exemplo, a ineficiência dos caminhões nas cidades é, em boa parte, uma adaptação dos caminhões à competição de tantos veículos. Se a ineficiência tornar-se muito grande, as empresas envolvidas ou se mudam ou fecham, o que é outro aspecto de erosão e dispersão nas cidades. Já dei um exemplo do diferencial de conveniência dos próprios veículos: os efeitos diversos sobre automóveis particulares e sobre os ônibus quando se impõe mão única numa avenida. O que é vantajoso para os automóveis é uma punição para os ônibus.
Uma pressão indiscriminada sobre os veículos poderia significar, em muitas ruas, um desestímulo para os caminhões e os ônibus, e também para os automóveis particulares.
Os caminhões e os ônibus são uma manifestação importante da intensidade e da concentração de uma cidade. E, como mostrarei em breve, se se estimular sua eficiência, o resultado também será uma redução de automóveis, como efeito colateral.
Devo essa linha de pensamento a William McGrath, diretor de trânsito de New Haven, que criou vários instrumentos para utilizar técnicas de trânsito conhecidas para o estímulo ou o desestímulo seletivo de veículos. A própria ideia já é brilhante. McGrath diz que ela lhe ocorreu aos poucos, ao longo de quatro anos de trabalho com os planejadores urbanos de New Haven, período em que ele se deu conta de que as técnicas sobre deslocamento e estacionamento de mais carros e sobre a utilização máxima de cada metro quadrado de leito de rua, que ele aprendera na faculdade, eram a maneira mais insensata de lidar com as ruas.
Uma das metas de McGrath é estimular o aumento da eficiência do transporte público, que atualmente, em New Haven, é sinônimo de ônibus. Para tanto, os ônibus que vão para o centro e o atravessam precisam ser mais rápidos. Isso pode ser feito, sem dúvida, diz McGrath, regulando a frequência dos semáforos para intervalos menores, sem sincronizá-los. Devido aos indispensáveis pontos de parada de ônibus nas esquinas, o intervalo mais curto dos semáforos afeta menos o tempo de viagem dos ônibus do que um intervalo mais prolongado. Esses mesmos intervalos curtos, sem sincronia, contêm e retardam constantemente o transporte particular, que seria assim desestimulado em usar essas ruas específicas. Por outro lado, isso significaria uma interferência menor nos ônibus, que seriam mais rápidos.
McGrath acha que um modo realista de instituir ruas de pedestres nos locais necessários num centro urbano muito movimentado é dificultar o acesso aos carros – principalmente embaralhando o sistema de semáforos –, de modo que “só um motorista de cabeça oca volte a pegar um caminho desses depois de ter tentado uma ou duas vezes”, e também proibir estacionar e parar. Depois de uma rua dessas ter atingido o ponto de ser usada apenas por caminhões que recebem ou entregam mercadorias e por outros poucos veículos, sua condição de rua de pedestres pode ser formalizada sem que ninguém se surpreenda e sem a necessidade de compensação, relegando um fluxo intenso e a dificuldade de estacionamento para outra rua. As mudanças de hábito necessárias já terão sido absorvidas por meio da pressão.
Na teoria, as vias expressas urbanas são sempre apresentadas como um instrumento para desviar os carros de outras ruas e, portanto, aliviar o tráfego de outras ruas. Na prática, isso só funciona na eventualidade de as vias expressas terem um fluxo bem abaixo de sua capacidade; esquece-se de levar em conta o provável destino, fora da via expressa, desse fluxo maior de veículos. Em vez de servirem de via de passagem, as vias expressas urbanas servem quase sempre de desaguadouros. No plano proposto por Moses em Manhattan, por exemplo, a via expressa – aquela que afetaria a Washington Square – é sempre apresentada, de forma tentadora, como uma rota rápida entre as pontes do Rio East e os túneis do Rio Hudson para manter o tráfego de passagem fora da cidade. Ainda assim, o plano concreto inclui um emaranhado de rampas de acesso dentro da cidade. Trata-se de um desaguadouro e assim, ao acomodar o tráfego que se dirige para o coração da cidade, ela tenderá na verdade a estrangular o tráfego de passagem, em vez de melhorá-lo.
McGrath entende que, se a função principal das vias expressas é aliviar as ruas da cidade, todas as suas consequências precisam ser consideradas. Em primeiro lugar, não deve haver aumento de espaço para o estacionamento de carros cujo acesso se fizesse por ruas que teoricamente deveriam ter o tráfego reduzido. Nem deveria ser possível, entende McGrath, os motoristas utilizarem rampas de saída para cortar caminho por ruas teoricamente aliviadas. McGrath soluciona essa questão da seguinte maneira: as ruas que poderiam ser usadas como alternativa às artérias quando estas se congestionassem deveriam ser protegidas com a criação judiciosa de becos sem saída; estes não afetariam o uso local das ruas, mas frustrariam a tentativa dos motoristas de colocar essas ruas nos itinerários das artérias e das vias expressas. Com aqueles instrumentos, as vias expressas só serviriam de rotas de passagem.
Certas rampas que dão acesso a cidades densas deveriam ser exclusivas de caminhões e ônibus. Poder-se-iam também favorecer os caminhões, ampliando ainda mais a ideia básica de McGrath. Os caminhões são vitais para as cidades. Eles representam serviços. Representam empregos. No momento, temos, ao contrário, táticas para impedir o trânsito de caminhões em determinadas ruas. Por exemplo, a Quinta Avenida e a Park Avenue, em Nova York, são proibidas para caminhões, exceto os que fazem entregas.
Trata-se de uma política sensata em algumas ruas, mas, tendo em vista uma estratégia para redução de automóveis, as mesmas táticas podem ser usadas pelo avesso em outras ruas. Assim, nos lugares em que as ruas se estreitam ou estrangulam a ponto de ser necessário decidir que veículos podem usá-las, a prioridade deve ser dos caminhões, dando-se permissão a outros veículos apenas se eles estiverem deixando ou pegando passageiros.
Ao mesmo tempo, as pistas mais rápidas das artérias de várias pistas ou de avenidas largas poderiam ser exclusivas de caminhões. Isso nada mais é que o contrário, por exemplo, da estratégia espantosamente leviana de Nova York de planejar a exclusão deliberada dos caminhões nas vias expressas mais rápidas, que atravessam as áreas mais densas da cidade, forçando-os a fazer viagens mais longas para atingir ruas locais.
Favorecidos por uma redução seletiva de veículos, os caminhões fariam entre si uma seleção natural considerável: a maioria dos caminhões com viagens de longa distância usaria as artérias mais rápidas, e as ruas estreitas ou obstruídas seriam utilizadas principalmente para entrega ou recebimento de mercadorias.
Num distrito onde ocorresse uma redução constante e seletiva de automóveis, seria de esperar que a proporção de caminhões no total de veículos fosse maior do que a que se tem hoje. Isso não significa que haveria mais caminhões, mas sim menos automóveis de passageiros. Quanto mais efetiva a pressão sobre os carros particulares, menos onipresentes os caminhões, porque eles não ficariam retidos ou ociosos como ficam atualmente. Além do mais, os caminhões que são usados para o trabalho, em vez de usados para ir ao trabalho ou voltar dele, costumam distribuir-se pelo horário de expediente, em lugar de se amontoarem em horários de pico.
Como já ocorre com táxis e automóveis particulares, inadequadas condições de estacionamento favorecem seletivamente os táxis. Essa também poderia ser uma forma útil de seletividade do tráfego, porque os táxis desempenham a mesma função que os carros particulares, mas multiplicada. Quando visitou os Estados Unidos, Kruschev compreendeu rapidamente esse diferencial de eficiência. Depois de observar o trânsito de São Francisco, ele comentou com o prefeito sobre o surpreendente desperdício de espaço, e é claro que ponderou a respeito do que vira, porque ao voltar para Vladivostok ele anunciou que sua política seria incentivar as frotas de táxis nas cidades soviéticas em vez de carros particulares.
No entanto, a seletividade, que deveria integrar uma estratégia bem-sucedida de pressão sobre os veículos, onde quer que a disputa entre eles a justifique, significa muito pouco isoladamente. Ela só terá significação se fizer parte de uma estratégia ampla de reduzir o número total de veículos nas cidades.
Ao avaliar que táticas e princípios de redução são apropriados, vale a pena observar um pouco mais o processo de erosão. A erosão das cidades pelos automóveis, que provoca consequências nada admiráveis, tem princípios que devem ser analisados. Uma coisa tão eficiente deve ter o que ensinar e merece ser respeitada e estudada de sua perspectiva.
As mudanças exigidas ou impostas pela erosão sempre ocorrem aos poucos – de tal forma que podemos chamá-las de insidiosas. Da perspectiva da vida da cidade como um todo, até mesmo as etapas mais drásticas desse processo envolvem mudanças paulatinas. Portanto, cada mudança é absorvida aos poucos, à medida que ocorre. Cada mudança “erosiva” requer mudanças nos hábitos das pessoas de se movimentar pela cidade e mudanças na maneira como elas a usam, mas nem todo o mundo precisa mudar de hábitos de uma só vez, nem todo o mundo (a não ser os desalojados) precisa mudar muitos hábitos de uma só vez.
A pressão sobre os automóveis exige mudanças de hábitos e também adequação de usos; assim como no caso da erosão, ela não rompe os hábitos de uma só vez.
A conveniência da pressão paulatina e progressiva tem também relação com a melhora do transporte público. No momento, o transporte público definha, mas não por falta de avanço nos recursos potenciais. Há profusão de recursos engenhosos relegados ao esquecimento porque numa época de erosão urbana não há razão para aplicá-los; não há recursos financeiros para isso; não há interesse nisso. Mesmo que o transporte público aumente pela utilização de táticas de pressão sobre os automóveis, é um sonho esperar que uma melhora revolucionária aconteça abruptamente ou ansiar por ela. O avanço do transporte público no século XX (coisa que nunca tivemos) deve acompanhar um aumento de passageiros e de passageiros previstos, assim como o declínio do transporte público acompanhou um decréscimo de passageiros e uma queda prevista de passageiros.
As mudanças erosivas paulatinas que corroem a cidade cumulativamente não são de forma alguma pensadas de antemão em algum esquema ou plano diretor divino. Se fossem, não seriam tão eficazes. Ocorrem majoritariamente como reações imediatas e reais a problemas imediatos e reais, assim que estes surgem. Dessa maneira, qualquer ação faz diferença; poucas são intenções ou medidas vazias. Essa mesma espécie de oportunismo terá ótimos resultados na pressão sobre os automóveis e também em relação à funcionalidade e ao desenvolvimento urbano. As táticas de pressão sobre os veículos deveriam ser aplicadas onde exista um conflito entre o fluxo de trânsito e outros usos urbanos e à medida que surjam novos conflitos desse tipo.
Por fim, os defensores da erosão urbana sempre abordam de modo positivo os problemas por solucionar. Fala-se, principalmente em círculos teóricos e refinados, em usar as vias expressas com o objetivo paralelo de erradicar cortiços. Porém, na prática, ninguém promove ou defende a utilização de vias expressas com o objetivo negativo de se livrar de outra coisa. Os objetivos são uma facilidade, uma velocidade ou um acesso maiores, ou supostamente maiores.
Também a pressão sobre os veículos deve ser feita com argumentos positivos, como forma de propiciar melhorias positivas, desejadas e compreensíveis, lançando mão de vários interesses urbanos específicos e palpáveis. Isso é desejável não porque uma abordagem dessas constitua um recurso político e persuasivo mais eficiente (embora seja), mas porque os meios que proporcionam aumento de diversidade, vitalidade e funcionalidade urbana em locais específicos devem ser palpáveis e positivos. Uma política que tivesse por objetivo primordial a exclusão dos veículos, que criasse tabus sobre eles e os multasse, com as crianças gritando “Carros, carros, fora daqui!”, seria uma política não só fadada ao fracasso, como também merecidamente fadada ao fracasso. Devemos lembrar que o vazio urbano não é melhor que o trânsito excessivo, e a população tem razão ao suspeitar de programas que não dão nada em troca.
E se fracassássemos em deter a erosão das cidades pelos automóveis? E se não conseguíssemos construir cidades vivas e viáveis porque as ações necessárias conflitam com as ações exigidas pela erosão?
A esperança é a última que morre.
Nessa situação, nós, norte-americanos, nem precisaríamos refletir sobre um mistério que aflige o homem há milênios: Qual é o sentido da vida? Para nós, a resposta será clara, definida e para todos os efeitos indiscutível: O sentido da vida é produzir e consumir automóveis.
Não é difícil entender que a produção e o consumo de automóveis sejam o sentido da vida para a diretoria da General Motors, ou o sejam para outros homens e mulheres muito envolvidos econômica e emocionalmente com essa ocupação. Se eles entendem assim, deveriam ser premiados, em vez de criticados, por essa notável combinação de filosofia e dever diário. É mais difícil entender, porém, por que a produção e o consumo de automóveis devam ser o sentido da vida deste país.
De maneira parecida, é compreensível que as pessoas que eram jovens nos anos 1920 tenham ficado fascinadas com a visão da Ville Radieuse de vias expressas e com a promessa ilusória de que ela seria adequada para a era do automóvel. Pelo menos era, na época, uma ideia nova; para os homens da geração do nova-iorquino Robert Moses, por exemplo, ela era radical e empolgante, numa época em que o raciocínio deles amadurecia e suas ideias se formavam. Alguns homens tendem a apegar-se a velhas paixões intelectuais, do mesmo modo que algumas beldades, quando se tornam senhoras idosas, ainda se apegam a modas e penteados de sua empolgante juventude. Contudo, é mais difícil entender por que essa forma contida de amadurecimento mental deva ser transmitida intacta a sucessivas gerações de planejadores urbanos e engenheiros. Incomoda pensar que os homens que são jovens hoje, os homens que estão estudando hoje para fazer carreira devam aceitar, sob o argumento de que precisam ter um raciocínio “moderno”, conceitos sobre as cidades e o trânsito que são não apenas inviáveis, mas que também não receberam nenhuma contribuição significativa desde que os pais deles eram crianças.
1. Um eufemismo.
2. Essa espécie de desperdício já ocorre com frequência nos centros urbanos onde há um planejamento deliberado de pouco uso. Assim, o novo centro administrativo de Pittsburgh, afastado e isolado na borda do centro, precisa ter um espaço de estacionamento para uso noturno que já existe na área de trabalho do centro e fica vazio de noite. O apoio mútuo de todos os tipos de instalações urbanas, inclusive áreas de estacionamento e de trânsito, assim como parques e lojas, exige um grande adensamento.
3. Num dos locais de estacionamento recomendado pelo diretor de trânsito – localizado muito “racionalmente” entre um magazine e as pilastras de um viaduto –, contei 129 estabelecimentos, inclusive várias mercearias sem similar que têm fregueses em toda a área metropolitana, algumas galerias de arte, alguns salões de beleza de cães, restaurantes muito bons, uma igreja e grande quantidade de residências, entre elas várias casas antigas recém-reformadas. Esses negócios incluem os que seriam tomados e os que ficam defronte deles, do outro lado da rua, porque formam um conjunto; os negócios que serão mantidos, que fazem frente para uma enorme garagem sem movimento, seriam privados de um grande apoio mútuo e também perderiam o movimento. A Comissão de Planejamento Urbano tem o mérito de se opor, neste exato momento, ao plano das garagens do diretor e pelos motivos corretos: o argumento de que o incentivo a mais veículos será prejudicial para outras coisas importantes.
4. Edmund Bacon, diretor da comissão de planejamento de Filadélfia, contou-me que os habitantes contrários à via expressa que ele defendia apareceram com cartazes em que se lia “Fritem Bacon”.
5. Apenas em Manhattan foram alargados 453 leitos de rua nos anos 1955-58, e o diretor dessa região administrativa avisou que isso era só o começo. Um programa de pressão sensato deveria abolir o estreitamento das calçadas; visaria, entre outras coisas, o alargamento das calçadas de pelo menos 453 ruas em quatro anos e consideraria isso só um começo.